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terça-feira, 9 de maio de 2017

Os bons, os bondosos e os benignos

Bondade é amar as pessoas mais do que elas merecem.
(Joseph Joubert)


Quando o apóstolo Paulo lista as características do amor em I Coríntios 13, ele ressalta que o “verdadeiro amor” não trata com “leviandade”. Ser leviano é proceder com hipocrisia, sem bases verdadeiras, tendo comportamento volúvel e agindo com insensatez. Num contexto “amoroso”, leviano se refere a pessoa que tem sentimentos rasos e sem comprometimento.

O leviano de coração “importa-se” sem "se importar". E, basicamente, “amar com leviandade” equivale a “não amar”. 

O termo BENIGNIDADE vem da palavra grega CHESTOTES e se caracteriza pela flexibilidade de tratamento gentil e cordato para com todo o tipo de pessoa. Lucas 6:35 revela que Deus é benigno até mesmo para com os maus e ingratos; afinal a benignidade faz parte da personalidade eterna e imutável de Deus (por favor, leia o Salmo 136 antes de continuar a leitura deste texto).

Na prática, o exercício da benignidade diz mais sobre o nosso caráter do que a própria bondade, pois está estritamente ligada ao desejo de não se fazer o mal, para consequentemente, praticar o bem. 

Por exemplo: quando o paciente recebe um diagnóstico positivo para uma célula cancerígena, a questão mais relevante é a “benignidade” do mesmo, pois um câncer considerado “benigno”, embora continue sendo uma patologia, “não” irá desencadear “males mortais” ao seu portador.

Deus jamais desejou qualquer tipo de mal ao ser humano (Jeremias 29:11, João 3:16) e até mesmo suas ações mais drásticas foram tomadas por amor (Hebreus 12:6), e logo deseja que seus filhos, criados sua imagem e semelhança (Gênesis 1:26) também possuam tal virtude.

A benignidade age no cristão como um tipo de anticorpo que combate sentimentos nocivos em relação as demais pessoas. É um agente de cura que age em áreas afetadas pelas mágoas ou pelo preconceito, possibilitando a prática do pedido feito por Paulo aos féis em Éfeso:

- Suportai-vos uns aos outros em amor (Efésios 4:2).

Podemos correlacionar e interligar a benignidade como outros sentimentos e algumas virtudes essenciais ao cristianismo, tais como, “afabilidade”, (cortesia e gentileza), “amabilidade” (condição de ser amável), “ameninade” (presença de leveza e delicadeza no trato), “benevolência” (boa vontade para com o próximo), “ihaneza” (sinceridade e lisura), “sociabilidade” (capacidade de viver bem em sociedade), “clemência” (disposição para perdoar), “filantropia”, “altruísmo” e “tolerância” (capacidade de suportar com paciência).

Em síntese, a “benignidade” é condição de “ser bom”, e não apenas a “ação de fazer o bem”. Ser benigno é ter a bondade inserida no próprio caráter, e não apenas praticá-la de forma ocasional. Logo, a bondade e a benignidade, são complementos uma da outra.

A benignidade é a bondade interiorizada, enquanto que a bondade é a benignidade exteriorizada. 

O termo “bondade”, vem da palavra grega AGATHOUSE, e pode ser interpretado como a qualidade correspondente a ser bom. Ou seja, a capacidade de manifestar satisfatoriamente alguma perfeição, que se pode aplicar a pessoas, coisas e situações. A bondade pode significar também a disposição permanente de uma pessoa em fazer o bem, e neste contexto, tem por sinônimo a benevolência. 

Quando nos deparamos com o termo “perfeição”, só o podemos aplicar plenamente ao próprio Deus, então, o único ser realmente “bom” em todos os aspectos da existência é o próprio Criador (Salmos 23:6, 31:19, 52:1).

Os salmistas declaram confiadamente, não apenas o fato de Deus ser bom, mas também o descreve como sendo o autor de toda generosidade e a essência da bondade. Como filho de Deus, o cristão deve buscar constantemente a bondade, vivendo sua vida moldada na vida do próprio Cristo, manancial inesgotável de bondade e ternura.

Não devemos nos contentar com uma bondade teórica, onde nos limitamos a não fazer o mal, mas sim colocar as mãos na “massa” exercendo na prática toda a bondade que existe em nós por meio do amor de Cristo.

Um vislumbre deste dever cristão pode ser no próprio código penal brasileiro, onde a omissão de socorro é tratada como crime. Em outras palavras, não fazer o bem e tão grave quanto se fazer o mal.

Adolf Hitler, sádico genocida, construiu seu império de terror tendo como alicerce a omissão dos líderes mundiais que se fizeram cego as atrocidades cometidas pelo partido nazista alemão. Atribui-se a Martin Luther King a celebre frase: "O que me preocupa não é grito dos maus, mas sim o silêncio dos bons”. A bondade não é um sentimento, é um incentivo a ação; pois quando os bons deixam de agir, não há mais oposição que impeça a vitória da maldade.

Conta-se a fábula, que numa certa fazenda, um rato corria desesperado pelo curral pedindo ajuda aos outros animais, pois o fazendeiro tinha comprado uma ratoeira. Entretanto, a “vaca” lhe respondeu:

 - O que isto tem a ver comigo, o problema é todo seu! 

A mesma resposta ele ouviu da galinha quando passou pelo galinheiro e do porco, quando pediu ajuda no chiqueiro. Ninguém se interessava pelos problemas do rato, estavam mais interessados em suas próprias vidas e não tinham tempo para pensar em ratoeiras. Naquela noite, o rato achou que seria seu fim.

Mas, antes mesmo que sucumbisse ao queijo fácil, outro ser foi vitimado pela ratoeira. Era uma serpente, que desavisada se enroscou na armadilha, e agora lutava desesperadamente para fugir. Ainda no escuro, a mulher do fazendeiro não percebeu a funesta ironia, e acabou sendo picada. O veneno agiu rápido e ela adoeceu profundamente.

Para tratar da enferma, o fazendeiro decidiu preparar uma canja. Para isso foi ao galinheiro e matou sua galinha mais gorda. A mulher, porém, só piorou. Muitos familiares vieram visitá-la, e para alimentar a todos, o fazendeiro matou seu porco. Dias depois a mulher faleceu. Amigos de todas as partes vieram para o funeral. Era preciso muita carne para alimentar tanta gente. E então, lá se foi a vaca.

Que tenhamos muita pressa em ajudar ao necessitado e socorrer ao aflito, da mesma forma que Deus cuida de nós. Davi sabia de sua obrigação com a prática diária da bondade, pois desfrutava plenamente da bondade de Deus. Exatamente por isto, no Salmo 23:6 ele declara que “era seguido pela bondade e pela misericórdia todos os dias da sua vida”.

Em Gálatas 6:2, após discorrer sobre os perigos das falsas doutrinas, Paulo orientou aos irmãos da Galacia que levassem a carga uns dos outros, e que se ajudassem nas dificuldades e trabalhassem juntos para eliminar aquele grande mal da igreja. Mais do que ser bons, eles precisavam praticar a bondade. Em outras palavras, podemos interpretar o conselho do apóstolo da seguinte maneira:

- Quando há uma ratoeira na fazenda... Todos estão em perigo!  

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