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sábado, 8 de abril de 2017

Nem toda CASA é um LAR

A família é a fonte da prosperidade e da desgraça dos povos.
(Martinho Lutero)


Viver requer muita responsabilidade, esforço e comprometimento. Fomos criados para constituir famílias, sem as quais, nenhuma civilização teria existido. Dentro do núcleo familiar, cada um tem sua função, regida por direitos e deveres muito bem delineados. Já no Éden, o homem foi incumbido de ser o provedor de seu lar, e a mulher, designada para ser seu amparo nesta árdua tarefa.

No quarto capítulo de Eclesiastes, Salomão está discorrendo sobre as injustiças que permeiam o mundo, e o quanto é difícil sobreviver a tantas intempéries. Então, ele aconselha aos seus leitores a jamais estarem “sozinhos”, pois quando dois se unem num mesmo propósito, as chances de sucesso em uma empreitada são potencializadas. Mas, é no versículo 12 que encontramos uma importante observação feita pelo calejado rei: 

O cordão de três dobras não se quebra facilmente.

Mesmo um cordão frágil, quando é dobrado, ganha maior resistência contra rompimentos. Se houver uma terceira dobra, rompe-lo se torna um desafio ainda maior. E esta, é, sem dúvidas, uma excelente metáfora para o casamento pleno e duradouro. Se marido e mulher caminham na mesma direção, possuindo sonhos, ambições e projetos em comum, cultivando com esmero o respeito e a fidelidade, então dificilmente qualquer elemento externo terá a capacidade de minar sua relação ou desestabilizar sua casa. Mesmo assim, se faz necessário um “terceiro elo”, uma cola incorruptível que une definitivamente partes já consolidadas: Deus.

O Salmo 127:1 é incisivo ao afirmar que se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os edificadores. Um casamento que se veda mantendo Deus do lado de fora, certamente estará fadado à ruína, suscetível a toda sorte de ataques e vulnerável às tentações. Para melhor entendermos esta equação, é preciso revisitar o Jardim.

Após trazer a realidade cada elemento do universo, o Criador tinha por hábito avaliar a própria criação. Em regra geral, concluía que tudo estava “muito bom”. Mas, houve uma exceção: A solidão do homem. Deus, então, fez Adão adormecer. E de uma de suas costelas forjou a mulher. Ao despertar de seu sono e se deparar com a mais bela das criaturas, Adão compôs um dos mais românticos sonetos de todos os tempos: 

- “Esta, sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne! Ela será chamada mulher, porque do homem foi tirada". Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e eles se tornarão uma só carne” (Gênesis 2:23-24).

Agora, diante de Criador, ambos eram apenas um.  O fato de Deus ter escolhido a costela do próprio homem como a matéria prima da qual se origina a mulher, não é mera coincidência. Nem da cabeça, para não se sentir superior a ele, e nem dos pés, para não ser por ele pisada. Do lado, próximo ao coração. No texto original, o termo usado para identificar a “costela” é TSELA, que pode ser traduzida literalmente por “LADO”. Da mesma raiz etimológica se origina TSELEM, que significa “IMAGEM” ou “SEMELHANÇA”. 

Mesmo tendo funções distintas dentro de uma relação, homem e mulher, macho e fêmea, Adão e Eva, são duas faces de uma mesma moeda, reflexo um do outro, partes que se completam para formar o todo. Adão entendeu perfeitamente esta linda realidade que Deus engenhosamente tinha planejado para a felicidade plena de sua mais amada criação, e então, testificou para que todo o Jardim pudesse partilhar de sua alegria: 

- Esta agora é ossos dos meus ossos, carne da minha carne.

Adão a chamou de “Mulher”. Deus a chamou de “Eva”. E concede a ela um título muito especial: “EZER” (Gênesis 2:18).

A expressão “EZER” tem sido interpretada de diversas formas: ajudadora, auxiliadora, adjutora. A tradução literal para esta palavra é “Ajuda” ou “Auxílio”, mas, para os poetas inveterados (Adão manda lembranças), da mesma raiz etimológica podemos transliterar a palavra “Tesouro”. Assim, quando Deus diz que fará para ele uma “ezer”, está subjetivamente dizendo que dará ao homem o “maior e melhor” presente que ele poderá receber na vida. Salomão, um “especialista” na arte do casamento (embora tenha errado miseravelmente na quantidade), entendeu muito bem o propósito de Deus ao apresentar Eva para Adão:

- Quem encontra uma esposa descobre algo excelente: recebeu uma bênção especial do SENHOR (Provérbios 18:22). 

E tratando-se de benção conjugal, a recíproca também verdadeira.

A Bíblia dá atenção especial as relações familiares, e dentro dela, encontramos os segredos de um lar bem-sucedido. Atencioso a esta questão, o apóstolo Paulo recheou suas epístolas com aconselhamentos familiares, frisando que o cuidado que temos com nossa família é um parâmetro para medir nossa vida cristã (I Timóteo 5:8). Assim, faz-se necessário que estejamos enquadrados nos desígnios de Deus para executá-los com zelo e amor dentro de nossa morada, transformando a “casa” em um “lar”.

CASA é um edifício qualquer destinado a morada de alguém. LAR é um ambiente de harmonia onde as pessoas vivem e se sentem bem.

Harmonia, ausência de conflitos, paz, concórdia. Como a Bíblia incentiva o desenvolvimento destas qualidades dentro da família. Um bom exemplo pode ser encontrado em Efésios 5:22-28. Neste texto, Paulo aconselha as mulheres para que sejam submissas aos maridos. Ao contrário do que muitos machistas de plantão tendem a acreditar, neste contexto, a palavra submissão conota o sentido que a esposa deve auxiliar seu esposo no cumprimento da missão a ele outorgada, pois o homem é a cabeça que governa a casa.

Porém, o texto prossegue e traz um vislumbre da tal “missão” dada aos maridos. Parte dela é exatamente amar suas mulheres como Cristo amou a Igreja, e se preciso for, morrer por ela. Em resumo, todo homem tem como dever matrimonial fazer sua esposa plenamente feliz. E se esta é a missão do marido, a submissão da esposa se revela no fato que ela deve agir de modo a facilitar o êxito desta "jornada". 

Ambos trabalham em conjunto para o sucesso desta empreitada, não se omitindo em momento algum. Afinal, só pode exigir “direitos” quem cumpre piamente seus “deveres”. Se o homem governa a casa, é a mulher quem edifica o lar (Provérbios 14:1). 

E ainda tem os filhos...

Nenhum relacionamento unilateral é saudável. Toda relação aprazível e produtiva se baseia numa via de mão dupla, onde muitas vezes é preciso perder para ganhar. Os pais são a autoridade constituída de um lar, tendo a premissa nas decisões e responsabilidade nas escolhas que norteiam sua família. Isto, porém, não lhes dá direito ao autoritarismo desmedido e nem justifica uma ditadura retrograda. É preciso diálogo, entendimento e companheirismo, para que as divergências sejam equalizadas numa solução aceitável a todos os envolvidos. Que todo o “SIM” seja responsável, e todo o “NÃO” revestido de justiça.

A vida apresenta pontos salientes onde são exigidas grandes decisões que determinam nosso futuro (bem como o de nossos filhos), mas, é na sutileza do dia-a-dia, através das pequenas ações, baseado em nossas posturas e atitudes cotidianas, que construímos os pilares desta relação familiar. Ida e volta.

Todo pai precisa entender que recebeu a missão maravilhosa de conduzir seus filhos a Deus. Os filhos são como um presente do Senhor, uma espécie de joia fina e muito rara, que precisa ser lapidada com esmero e amor. Conduzir, preservar e preparar os filhos para Cristo é dever de seus progenitores. Podemos comparar os filhos com os vasos. Um vaso foi fabricado para ser cheio de algo, e alguém precisa escolher o conteúdo e despejá-lo ali. Cristo é o conteúdo que está destinado para eles (I Coríntios 4:7). A primeira noção espiritual que os pais precisam ter com relação aos filhos que Deus lhes deu, é que eles precisam ser cheios de Cristo.

Quando um filho nasce, seus pais têm a oportunidade de compreender com um pouco mais de propriedade o amor do próprio Deus. Afinal, para aquele pequeno ser que acaba de chegar ao mundo, é destinado todo o afeto e cuidados que seus progenitores são capazes de gerar. Amor sacrificial, incondicional e irrestrito, externado em total devoção, mesmo sem (na maioria das vezes) receber nada em troca. Da mesma forma que Deus age em nosso favor.

O Salmo 127 ressalta que o nascimento dos filhos deve ser motivo de muita alegria, pois eles são como “flechas na mão do valente”. Por outro lado, o texto expõe com veemência a responsabilidade que temos para com nossa prole: - Os filhos são herança do Senhor, e o fruto do ventre, o seu galardão (Salmo 127:3). A grande verdade aqui explicitada pelo salmista, é que Deus “não” nos dá filhos. Ele nos “confia” seu galardão. 

Nossos filhos são propriedade de Deus, herança do Senhor, e o papel a ser desempenhado pelos pais não é de posse, e sim de mordomia. Cuidamos de um bem precioso que não nos pertence. É de Deus. Segundo o jargão popular, criamos nossos filhos para o “mundo”, mas, pela Bíblia, os estamos guardando para o Senhor. 

Como é maravilhosa esta revelação E ao mesmo tempo, aterradora. Deus zela pelos que são seus, e nossa mordomia será medida, pesada, avaliada e cobrada. O que teremos a apresentar? Esta pergunta nos gera ansiedade, e no afã de zelarmos por seus filhos, muitas vezes a relação de um casal se desgasta.

Em regra geral, contos de fadas, novelas, livros e filmes românticos transmitem a mensagem que o casamento abre as portas do “feliz para sempre”. No mundo real, quando duas pessoas decidem dividir suas vidas, estão se propondo caminhar lado a lado, numa só passada e sem destoar o ritmo. Mas, não é exatamente assim que a jornada acontece. Seres humanos são dotados de inúmeras emoções, possuem intocáveis terminações nervosas, assimilam sensações e reagem a elas de forma não padronizadas.

Sob um mesmo teto, teremos duas formas diferentes de enxergar o mundo, de interpretar a vida, de enfrentar as perdas, de vivenciar as conquistas. Some a isto uma bagagem de ideologias, conceitos e verdades pertinentes a cada um, e que inevitavelmente, irão se chocar. Antes da vida a dois, cada indivíduo já construiu seu caráter, firmou suas crenças e definiu sua ética pessoal. Agora, tudo isso passa a coexistir dentro de uma caixa vedada, onde o risco de explosão é permanente. Esperar que nenhuma desavença surja desta mistura, é como andar em um campo minado sem se importar com o perigo ali escondido.

Em I Coríntios 7:29, Paulo alertou aos corintos que aqueles que contraem matrimonio, terão sim tribulações por causa da carne. Mas, se existe amor, os problemas são atenuados intensamente, pois ele tudo crê, tudo espera, tudo suporta e jamais acaba (I Coríntios 13:7).

Uma vez unidos, homem e mulher se fundem num único ser. O corpo de um passa a pertencer ao outro e os sonhos do outro passa a depender daquele um. Um vínculo é estabelecido no corpo, na alma e no espírito. Dois se tornam em um, num amálgama que já não se pode desfazer. Adão declarou está verdade em Gênesis 2:24; Jesus a validou em Marcos 10:12 e Paulo a ratificou em Efésios 5:22-35.

É como se fossem duas folhas de papel coladas, dois tijolos cimentados, duas vigas de metal soldadas. É até possível separá-las, mas será inevitável marcas, ranhuras e danos permanentes. Separados, viverão para sempre como apenas uma metade, pois o “todo” que haviam se tornado, simplesmente deixa de existir.

O desafio é grande. Mas, toda família precisa transformar sua CASA num LAR. Não há sobrevivência para ela fora desta realidade. Particularmente, considero pontual e definitiva uma afirmação do escritor Augusto Cury, que diz: 

- Se você passar por uma guerra no trabalho, mas tiver paz quando chegar em casa, será um ser humano feliz. Mas, se você tiver alegria fora de casa e viver uma guerra na sua família, a infelicidade será sua amiga.

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